segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

211.


Foto de M

Atrai-me a personalidade dos objectos e a sua aparente solidão no mundo das pessoas. Atribuo-lhes alma humana, nalguns encantam-me a elegância, a delicadeza dos traços, a graciosidade dos gestos naquela espécie de movimento suspenso no tempo. As flores pintadas no corpo lácteo, tão discretas, o vestido comprido e esguio rente aos pés, os braços erguidos em jeito de dança, as cores do voo no íntimo dos pássaros. Na sala de estar de minha casa, eles pousados sobre o móvel, eu sentada no sofá onde me refugio do cansaço, olhamo-nos e comunicamos no silêncio das nossas existências. De vez em quando levanto-me e aproximo-me deles, toco-lhes, lembro-lhes histórias antigas, mudo a posição em que se encontram para que não se sintam entorpecidos. Depois, regresso devagar a tudo o resto que compõe a minha vida. 
M

5 comentários:

Licínia Quitério disse...

A vida dos objectos através das nossas vidas. A sua elegância através da elegância do teu olhar, do teu toque.

Manuel Veiga disse...

uma finíssima nostalgia atravessa a vibração dos delicados objectos.

o "perfume" da tua escrita - sempre! e beleza e sensibilidade, pois claro!

beijo

Justine disse...

Um texto de encantar, M.. E nele se reflete a tua sensibilidade!
(ah, aquela jarra Arte Nova...)

bettips disse...

As conhecidas coisas, que falam dos lugares e nós falando com elas. Uma delicadeza, diria maviosa a voz que se/tu ouves. Discretos, os vidros de leite e irisados do sol.
Será também esse o encanto dos (teus) cantos.

bettips disse...

O modo das coisas falarem para quem as sabe ouvir. Não são objectos, são memórias e afectos, têm vida própria. Diria que maviosa a voz que ouves no leitoso ou irisado do vidro.