quinta-feira, 23 de março de 2023

Teoria dos Cinco Elementos - Metal (*)

Foto de M

Praça da Figueira, Lisboa.

(*) A minha participação na proposta da Mónica para este mês no Palavra Puxa Palavra.

sábado, 18 de março de 2023

Fausto

     Vendia a minha alma por um colo! Há muito que a ideia se lhe enroscara no corpo de tanto a pensar. Vivia dia e noite na imobilidade de uma prateleira de vidro frio pregada na parede daquela loja onde tudo o que pudesse ter tido vida morrera de tédio. Entusiasmara-se a princípio com o lugar que lhe fora destinado e amiúde se revia na superfície brilhante que lhe servia de espelho, mas o tempo embaciara-lhe o desejo. Entregara-se tristemente ao desencanto cerrando os olhos, para só lhes abrir uma fresta sempre que a campainha da porta tilintava curiosidades que varriam o espaço apertado em que morava e que depressa dele se cansavam. Todavia, até desse abrir e fechar de olhos desistira Fausto e quase os colara de vez, cobrindo-os com uma das patas e forçando a cabeça de encontro ao pó que lhe servia de cama.

     Olha a gata! pareceu-lhe ouvir na lonjura enevoada dos seus pensamentos.

     A gata?! Rodou a cabeça 90 graus e espreitou: fixavam-no atentamente dois olhos verdes poisados no rosto de uma menina de cabelos negros atados por uma fita de seda vermelha.

     - É muito bonito, não é, Ágata? Gostavas de o levar contigo? – ouviu perguntar.

     Ah, agora percebo! Pois não podia ser uma gata, que está lá fora no vidro da montra um papel a proibir a entrada de animais!

     Foi então que Fausto se sentiu a voar, como se tivesse também ele asas de pássaro. E tremia. Não sabia se por causa do medo se pela esperança naquele voo que o arrastava do vidro frio e inerte para a concha quente e macia das mãos de uma menina.

M

quinta-feira, 16 de março de 2023

Teoria dos Cinco Elementos - Terra (*)

Foto de M

Cores da Terra.

M

(*) A minha participação na proposta da Mónica para este mês no Palavra Puxa Palavra

quarta-feira, 15 de março de 2023

Provocações mútuas

Dona Consciência

Vê-se bem que não limpas o pó… Que inconsciência! – disse a Dona Consciência das cabeças adultas. E continuou o sermão: - Não tens mais nada que fazer do que andar a brincar às internetas? No meu tempo não havia tempo para…

- No seu tempo não havia tempo? – interrompi eu com ar de gozo, olhando-a de alto a baixo, porque ela era enorme, uma perfeita avantesma. - Então decida-se lá, o tempo era seu ou não? Não percebo! E fique sabendo que não são netas. Eu ainda não tenho nem netos nem netas, isso é para os meus amigos adultos.

- Não sejas atrevida! – respondeu Dona Consciência, inchando-se-lhe e empurrando-se-lhe o afogueamento dentro das barbas do espartilho até se pendurar ufano nas suas duas bochechas até aí pálidas de ciência adquirida com s no meio.

Estás quase a perder a tramontana, que eu bem te conheço!, pensei com os meus botões, porque eu gosto muito de coleccionar botões para depois conversar com eles. Há-os com dois buraquinhos, com quatro e sem nenhum. Esses têm apenas um pequeno pé. Eu acho mais graça aos que têm furos, sempre se pode olhar para mais sítios, os outros ficam sem ar, sempre agarrados aos tecidos onde os pregam. Eu julgo que nem pondo o pé de lado eles conseguem ver alguma coisa.

- És uma perfeita criança! – disse a Dona Consciência olhando-me com desdém, ao mesmo tempo que deixava que o seu sorriso cheio de tramontana espreitasse por entre os seus lábios trémulos, que mais pareciam duas minhocas rosadas. – Vê se cresces!

Eu calei-me e fiquei a olhar para mim à espera de me ver crescer. Será que se vê?

M