No Fotodicionário desta semana a palavra proposta foi Amizade. Palavra de múltiplas interpretações e facetas, penso eu, e de certo modo difícil de exprimir por fotografia.
Participei no jogo mostrando este recanto do jardim de uns amigos. É assim que sinto a amizade. Como espaço de diversidade, cores, tolerâncias e cedências, onde pequenas sementes lançadas à terra germinam sem inquietação de primazias e se oferecem com simplicidade à frescura da vida. Rebentos que se abrem em flor na exuberância dos instantes, murchando também com a morte desses mesmos instantes. E o brilho do sol a rasgar a neblina das manhãs indecisas, e a sentir-se bem na companhia das tardes amenas à beira dos caminhos. Até se perder a luz nas sombras do entardecer, deixando-se ali ficar com os olhos piscos de cansaço, entendendo o silêncio dos pássaros, adormecendo a seu lado.
M
quinta-feira, 31 de julho de 2008
73.
quinta-feira, 24 de julho de 2008
72.
O olhar azul suspenso na curva do caminho e a mão que acena de longe um Já venho, não demoro esvoaçando ali como borboleta de asas delicadas. Momento de encontro na distância dos instantes. Até que a ausência volte a ser presença e afago macio sentido na pele. Agora, mais perto, apetece a urgência de subir e descer a vida em degraus de pedra forrados de musgo.
E haverá uma flor para oferecer. Mais logo.
M
quarta-feira, 23 de julho de 2008
71.
domingo, 20 de julho de 2008
Na Serra de Montejunto III
Coreto de aldeia (Foto de S.)
À Espera dos Convidados
Foi lá que o vi: no cimo de um monte, em aldeia branca com flores e gatos nas janelas. Parecia uma mesa de festa coberta com toalha de renda, preparada para celebrar a música dos homens no silêncio azul do universo.
M
Publicado no Fotoescrita em Junho de 2006
Na Serra de Montejunto II
A balança (Foto de S.)
E Ficar Ali
Este prazer imenso de tocar a quietude e de a sentar ao nosso colo! E esperar que ela nos dê um beijo azul. E depois outro, em tons de verde salpicado de branco, cheirando a flores e a laranjas. E ainda outro, límpido de tão calado. E ficar ali, à espera do voo dos pássaros. Esquecer os pesos do mundo.
M
Na Serra de Montejunto I
Clair de lune (Foto de S.)
Claire de Lune
Quem sabe então se este Clair de Lune que paira entre as ruínas de um mosteiro no alto da Serra de Montejunto não terá sido o nome de alguém a quem, na ânsia de lhe contar e conhecer a vida (ou de a desprezar), os habitantes das aldeias vizinhas terão feito desaparecer a letra "e" no final do nome? Se assim aconteceu, embora esta ideia não seja mais do que uma suposição minha sem qualquer fundamento, confesso que me apetece acrescentar-lho de novo e chamar-lhe Claire de Lune. E imaginar uma rapariga de cabelos soltos vagueando pelos montes em noites de luar pela mão de Claude Debussy. Apesar das ruínas. Apesar do tempo que se desmorona mas que igualmente se reconstrói ao modo de cada um. E porque a lua está presente também nos nossos dias, no mistério do que nos toca e se deseja.
M
Publicado no Fotoescrita em Junho de 2006
Ainda a propósito de ausência
Degraus com passado, degraus com futuro (Foto de S.)
O Silêncio da Ausência
Sempre me impressionaram os espaços vazios onde me cruzo com a ausência dos outros. Lugares onde pressinto presenças que eu não conheço, pessoas que ali se demoraram, ou que passaram apenas, que nunca mais voltaram. Ou ainda lugares onde reencontro a memória dos que estiveram a meu lado num determinado momento. Dos que aí riram comigo, que brincaram, que exprimiram pensamentos e dúvidas, que calaram mágoas, que sussurraram inquietações ao meu ouvido, que me escutaram, que me acompanharam no meu silêncio.
Lá longe, numa universidade em Gdansk, emocionei-me também na presença calada desta escada pejada de movimento adivinhado. Não porque conheça quem tenha subido e descido estes degraus magníficos, ou que pressa ou ócio de viver os pisou. Emocionei-me unicamente por causa da tal ausência. Não sei que pedaços de vidas se apoiaram neste corrimão, apenas os imaginei, mulheres e homens plenos de actividade, professores e alunos trocando experiências e entusiasmos, ocupando este lugar de passagem entre o passado e o futuro. Imaginei-os também em desespero, excluídos, usurpado o seu espaço de saber, transformado num hospital dos nazis, a desumanidade da guerra desmoronando-se pouco a pouco com o edifício. O caos. E de novo a esperança poisada nas mãos dos alunos que seguraram cada pedra, cada tijolo, cada minuto do seu tempo, e assim contribuíram para dignificar a sua casa destruída pela insanidade da guerra.
Foi assim que os senti, a meu lado no silêncio dos seus passos e das suas existências.
M