domingo, 20 de julho de 2008

Ainda a propósito de ausência





Degraus com passado, degraus com futuro (Foto de S.)

O Silêncio da Ausência

Sempre me impressionaram os espaços vazios onde me cruzo com a ausência dos outros. Lugares onde pressinto presenças que eu não conheço, pessoas que ali se demoraram, ou que passaram apenas, que nunca mais voltaram. Ou ainda lugares onde reencontro a memória dos que estiveram a meu lado num determinado momento. Dos que aí riram comigo, que brincaram, que exprimiram pensamentos e dúvidas, que calaram mágoas, que sussurraram inquietações ao meu ouvido, que me escutaram, que me acompanharam no meu silêncio.
Lá longe, numa universidade em Gdansk, emocionei-me também na presença calada desta escada pejada de movimento adivinhado. Não porque conheça quem tenha subido e descido estes degraus magníficos, ou que pressa ou ócio de viver os pisou. Emocionei-me unicamente por causa da tal ausência. Não sei que pedaços de vidas se apoiaram neste corrimão, apenas os imaginei, mulheres e homens plenos de actividade, professores e alunos trocando experiências e entusiasmos, ocupando este lugar de passagem entre o passado e o futuro. Imaginei-os também em desespero, excluídos, usurpado o seu espaço de saber, transformado num hospital dos nazis, a desumanidade da guerra desmoronando-se pouco a pouco com o edifício. O caos. E de novo a esperança poisada nas mãos dos alunos que seguraram cada pedra, cada tijolo, cada minuto do seu tempo, e assim contribuíram para dignificar a sua casa destruída pela insanidade da guerra.
Foi assim que os senti, a meu lado no silêncio dos seus passos e das suas existências.
M

Publicado no Fotoescrita em Agosto de 2005

3 comentários:

Justine disse...

Foto magnífica para um texto sentido, nostálgico, quase pungente. Ou vice-versa.
E imagino-te a viver as memórias dessa viagem...

Maria Laura disse...

Lugares com história que neles fica e que podemos sentir. Magnificamente capturado na foto e no texto.

bettips disse...

Ah ... reler/rever, a maravilha em torno (e do retorno) da beleza irreal. Grata M. pela partilha assim, simples.
Abç