sábado, 19 de setembro de 2015

219.


Foto de M

Desproporção. A palavra surgiu no meu olhar mal cheguei ao terreiro repleto de gente entre o Palácio do Louvre e o Jardim das Tulherias e os vi ajoelhados no chão, como se rezassem, indiferentes aos passos de quem atravessava aquela aparente terra de ninguém. Eram seis, com as suas lojas ambulantes de chapéus, óculos escuros da moda, bugigangas e souvenirs para todos os gostos. Organizavam, uma vez mais, os objectos que breves momentos antes, suponho que a um sinal de aviso combinado, tinham enrolado à pressa nos seus panos-montras como precaução para uma fuga iminente. A polícia não apareceu, pelo menos por agora podiam sossegar. A escassos metros, as sólidas paredes do Louvre contrastavam com a fragilidade da existência humana. E eu, testemunha muda, reflectia sobre a realidade que me cercava e me afligia. Este homem em particular impressionou-me. Senti-me comovida pela delicadeza com que pegava nas pequenas réplicas da Torre Eiffel e as colocava em pé, bem alinhadas, tentando cativar o olhar dos transeuntes. Pensei, procurando encontrar algum consolo dentro de mim: talvez só por amar muito o que tem para vender ele consiga sobreviver entre as dicotomias da cidade imensa.
M

4 comentários:

Licínia Quitério disse...

Contrastes tão dolorosos que os teus olhos percebem.

bettips disse...

Gostei muito. Nas paisagens idênticas, uma visão delicada e tua, das diferenças humanas.

Manuel Veiga disse...

beijo.

sensível e inteligente, pois claro!

beijo

Justine disse...

A tua sensibilidade e as misérias humanas na bela cidade!