terça-feira, 16 de junho de 2015

218.


Foto de M
  
Tivesse eu visto o seu rosto, quem sabe seria capaz de entender o que lhe ia na alma.
Eu estava por ali e reparei nela à distância. Impressionaram-me o desalinho da sua figura e a total imobilidade em que se manteve durante a hora e meia em que permaneci no jardim. Interroguei-me, e interrogo-me ainda, sobre quais seriam os seus pensamentos. Contemplaria calada, ou até de olhos fechados, o rio da saudade de longínqua terra muito sua? Que pobreza a afligiria? Não sei, não lhe vi o rosto. Talvez estivesse feliz. Talvez lhe bastasse poder sentar-se à beira de um rio azul. Talvez fosse essa a sua única riqueza. Eu vim embora sem nada conhecer da mulher. Ela ficou.
M

6 comentários:

Justine disse...

É uma foto perturbadora, M.: o contraste entre a serenidade da paisagem e o ar sofrido/dorido/desarrumado da figura humana (assim a sinto...)é inquietante!

Manuel Veiga disse...

dói demasiado a face negra da vida...
tantas vezes.

beijo

Unknown disse...

Olá, M.
Quantas histórias caladas, perdidas no silêncio e nas ausências.
Quantas vezes agradeço que não vejam o meu rosto...

bj

Menina Marota disse...

O lado oculto da perturbadora existência de tantos seres humanos.
Sensível imagem e texto.
Grata.

Anónimo disse...

Cogito. No que nos juntou, nos fios: agora tu, no mesmo ar, amanhã eu, respirando "magenta". Que vida é a de viver? que vida é a de recordar? que Parcas nos tecem? que apoio nos damos? que vento nos levará?
Assim, ou recordando o fulgor súbito das manhãs (não sei, li e ouvi dizer) nas árvores de África. Ficamos, até onde nos for possível.
A poucas horas de aterrar perto.
E tanto, o longe.
Bjinho na volta, da bettips

Licínia Quitério disse...

Uma impressionante simetria no desalinho da figura. Afinal, do outro nunca sabemos nada.