sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

NATAL, UM LUGAR NAS NOSSAS VIDAS


Foto de M 

1. As luzes e as sombras do Natal  
Entre as várias fotografias que resguardo na pasta dos meus Natais em família ao longo dos anos escolhi esta, relativamente recente, por me parecer significativa para o tema sugerido. Olho-a demoradamente, o ambiente de luz e sombras encanta-me. Os suportes de vidro das velas vermelhas lembram-me o carreirinho empedrado de um postal meu de criança onde três meninos caminham uns atrás dos outros, com lanternas acesas nas mãos, pelo meio do arvoredo. Imagino-os à procura do Presépio que a minha Tia Chanel fazia, com muitas figuras de barro pintado e musgo apanhado na Tapada da Ajuda. Dezembro tinha sempre uma agenda cheia e a preparação da ementa do jantar de Natal estava na lista. Comprou-se então um perú ao homem que passava na rua (em bairro de Lisboa!) orientando com um graveto o seu bando de perús. Levado ao colo escada acima para a cozinha do nosso terceiro andar, viria mais tarde o pobre animal a cambalear tristemente, embriagado pela aguardente que lhe tinha sido despejada goela abaixo. De tal maneira o episódio me impressionou que ainda o vejo entre as sombras da memória, mais a faca nas mãos da cozinheira pronta para o degolar. Cena cruel, convenhamos. Afastei-me, incomodada, antes que o “perucídio” se consumasse diante de mim, e refugiei-me em pensamentos alegres, antecipando os momentos de festa dos dias seguintes. Na manhã de 25 de Dezembro, em fila indiana, todos de roupão, o meu Pai na frente, a minha Mãe, eu e o meu irmão, dirigimo-nos à cozinha, ansiosos por descobrir que surpresas guardariam os nossos sapatos ali colocados na véspera. Após limpeza primorosa do fogão a gás e da chaminé larga, por onde desceria o Menino Jesus (na casa da minha infância não existiam exaustores nem o Pai Natal era visita da família), tornara-se a cozinha palco digno de coreografia natalícia. 
Um tempo que foi e continua a marcar presença, embora de maneira diferente. Porque o Natal é um lugar nas nossas vidas.

M

1 comentário:

Anónimo disse...

Tantos Natais e só uma infância,
de velas
costumes
presépios com musgo "a sério"
perus embriagados (cá era vinho do Porto)
e a magia de esperar pelos presentes.
Recordações que descreves com grande beleza, uma certa ironia, um deslumbre.
B