Foto de S. (Silhuetas de amigos)
Podia
ser o título de um filme
Silhuetas
de amigos.
Podia ser o título de um filme a preto e branco. Mudo, com gestos
apenas, daqueles em que se adivinham os afectos por detrás das
fisionomias, desenrolados no mutismo da bobina, o argumento saltando
para o ecrã do nosso silêncio. O silêncio do entendimento das
imagens sem voz audível dentro de nós, o prazer da conjectura sobre
o que não é claramente revelado.
Julgo que o ritual da
pesca é também calado e pensativo, cada gesto lento, avaliado antes
de a linha ser lançada longe. Um diálogo de palavras guardadas
entre o pescador e a cana de pesca, expectativas atiradas sobre a
água que corre mansa, desejos que flutuam, que mergulham, que
desafiam. A tentação espetada no anzol, e o peixe lá em baixo, um
pequeno isco atravessando-se na sua estrada azulada, obrigando a um
desvio de caminho, a uma paragem. Um salto, um paladar a
experimentar, um sabor a que se não resiste, um puxão na linha, um
sinal rapidamente enrolado no carreto. Uma desilusão agarrada ao
anzol? Que importa? Existem mais engodos miúdos dentro da cesta à
espera dos dedos hábeis do pescador.
Acção!
De novo o ritual da cilada, luz e sombra, contrastes na paisagem. Há
que respeitar o fim do filme: um peixe preso num voo contrafeito,
dançando o seu último bailado prateado a solo, pingando azul sobre
o sorriso do pescador, debatendo-se a seus pés com a vida.
Desistindo dela, impotente perante a degustação adiada de um homem
paciente.
M
(2005)